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9 de Abril, 2025

As frustrações dos chibutenses

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Cada fase, etapa, movimento ou transformação social traz consigo as suas próprias expressões, linguagens ou comunicações que procuram traduzir a sua essência, racionalidade ou perspectiva. As manifestações de contestação dos resultados eleitorais de 9 de Outubro do ano passado trouxeram consigo, entre outras expressões, a palavra welar. Numa análise linguística básica, diríamos que, esta (welar), se trata de uma palavra da língua xixangana que tem como raiz ku wa, que significa, em português, cair. E aqui temos, no próprio xixangana, um verbo derivado, o ku wela, que significa, no sentido literal, cair em cima de alguém ou de alguma coisa; no sentido estilístico, significa ir contra alguém, pressionar, violentar ou agredir alguém. ‘Welar’ parece ser o aportuguesamento do verbo ‘ku wela’, sem o prefixo ‘ku’. E, por aquilo que fomos vendo e ouvindo, parece ter o sentido figurado de ir para cima de alguém ou de alguma coisa. Foi assim que fomos ouvindo, ao longo desses intermináveis, abomináveis, sacrílegos cinco meses, expressões como: Hi taku wela; ahimu weleni; ahiva weleni; Ou, vamos-te welar! Vamos-lhe/s welar!

Pois bem! Semana passada, fui bem “welado” por uns tantos amigos conterrâneos chibutenses, portanto, gazenses. Fui welado na sequência do meu artigo da semana passada com o título Moamba (Ka Mwamba). Dois dos welantes ou weladores associaram este artigo a outro que escrevi ano passado sobre Xinavane, justamente com o título do mesmo nome. Nestes dois artigos, manifestei a minha grande indignação pelo facto de distritos como estes, Moamba e Magude, permanecerem na penúria, no cinzentismo, no marasmo, a despeito de serem grandes nomes em terras aráveis, criação de gado diverso, sobretudo bovino. As respectivas vilas-sedes carregam consigo um ar de esmorecimento, abandono, escombrice quase total; desenvolvimento, fluorescência, beleza, urbanidade, urbanização, disciplina e organização territorial… nada!

Os meus conterrâneos pegaram justamente por aqui. Primeiro, acusaram-me de ser mais dos mesmos, o que na óptica deles é estranho, pois, sendo eu cronista devia ter a capacidade de uma visão diacrónica e holística. No lugar de falar de outros distritos como Macia, Magude e Moamba, devia falar também de Chibuto, nossa terra; de Manjacaze, terra de Mondlane. E dizia um dos welantes que isto não admira, pois Gaza – e Chibuto em particular – teve e tem dirigentes de topo que não se dignaram a fazer a mais pequena coisa pelo seu distrito e província. Tivemos desde Chefes de Estados, ministros, deputados, embaixadores, governadores, mas até aqui Gaza é uma das províncias mais pobres do país. Daí que não admira que o Guerreiro Mabunda esteja mais preocupado com outros distritos além e relegar para silêncio o seu próprio, como tantos dirigentes que tivemos e temos – welou-me um deles.

Um outro pegou nas pauladas e deu-lhas um tom mais contundente. Chibuto tem os problemas de sempre, desde a sua origem: falta de água, falta de energia eléctrica de qualidade, pobreza, falta de um hospital de referência, estradas precárias, nalguns sítios faltam pontes ou pontecas, erosão; a estes acrescem a ausência de infra-estruturas de qualidade, desindustrialização e desurbanização do município (Chibuto já teve alguma indústria de transformação), não se sente a expansão disciplinada, ordenada, consistente da urbe.

E Chibuto tem potencial: há terras consideráveis de produção agrícola (milho, arroz, hortícolas), por exemplo, as terras de Santo Gil, que produziam algodão; as terras de Chicacate; há criação de gado (Mohambe foi um dos maiores criadores de gado do país, mesmo depois da proclamação da nossa independência). Além de tudo isto, que não é pouco, CHIBUTO TEM AREIAS PESADAS INCABÁVEIS!

E é aqui, atalhou outro chibutense, onde as nossas frustrações sobem de tom. Os chineses já estão a explorar as areias pesadas, mas Chibuto, como tal, não beneficia absolutamente de nada, senão da infertilização de parte considerável das suas terras. NADA. Não anda nem desanda. Estamos sem estrada/s… os chineses estão a usar as de terra batida que já havia antes da independência; não asfaltaram ou pavimentar um único metro de estrada, nem mesmo fazer melhorias ou beneficiações; nas condições em que está, Chibuto merecia ter um hospital de referência… temos que recorrer à de Xai-Xai; com a vinda dos chineses, eu até cheguei a sonhar com qualquer coisa como Universidade Agrária de Chibuto ou de Gaza, que ajudaria os criadores tradicionais a melhorarem cada vez mais a arte de criação de gado e a agricultura local. Nada de nada. O que os chineses nos trouxeram foi um simples supermercado para, pior dos piores, sacarem as pobres economias das comunidades locais de Chibuto e não só. Emprego que é bom, é só escravização dos nossos compatriotas, salários miseráveis, regime laboral próprio de exploração de homem pelo homem, destratos acima de destratos. E o mais frustrante, guerreiro, foi sabermos que afinal tal supermercado pertencia a um dirigente e, chegado o momento combinado entre eles, foi-lhe passada a gestão da infra-estrutura e até os slips de pagamento eram de um outro estabelecimento, algures no Moçambique adentro!…

Estas são as nossas frustrações, nós, chibutenses de gema, alma e coração, que o Guerreiro Mabunda não cronica! Não as vê, não as sente! Tal como os muitos outros que à boca cheia se declaram amantes de Chibuto, recitam sempre xiwa niku pfuka; ka misinya yaku ringanana, yaku pswala matxikiri!

 

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