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16 de Abril, 2025

Sobre a Banalização do Debate no Espaço Informativo

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Sou do tempo da transição da imagem da TV a preto e branco para a colorida. Era apanágio de poucos ter uma TV em casa e conseguir captar bem o sinal.

A Rádio lá de casa era da marca Xirico e funcionava ou à pilha ou com um transformador de energia. Ouvíamos apenas uma emissora – a Rádio Moçambique; e, de tão vivas que eram as vozes dos fazedores dos programas, dava impressão que os via pela rádio.

A hora do telejornal era religiosamente um momento de família em que sentados ao sofá nos permitíamos sentir o pulsar do país, da região e do mundo. Depois vinham as telenovelas e mais tarde o fecho da emissão com as famosas barras verticais coloridas que antecediam o hino nacional. Nunca pensei que fosse ter saudades daqueles tempos. Hoje, com mais qualidade tecnológica e mais disponibilidade de canais e programas, vejo a televisão banalizar-se a cada dia que passa.

Cresci a ver na televisão e a ouvir na rádio o melhor do que se fazia. De tão bom que era o momento, parecia tudo fácil de se fazer. Era um convite diário à informação útil, programada, rigorosa, comprometida e de utilidade pública.

Os profissionais daquela altura eram de gabarito e reconhecido mérito, que doavam todo o seu saber, o seu ser e o seu fazer de forma abnegada e altruísta.

Eles foram os heróis do nosso tempo. Informar era um acto que obedecia a padrões, metodologias e critérios bem assentes no profissionalismo e brio. Com tão poucos recursos, se fez muito em prol do bem informar e formar – era uma escola de comunicação. Se pudéssemos todos escolher uma profissão ligada à comunicação, a escolha seria óbvia.

O tempo foi passando e novas dinâmicas foram emergindo. Não sei ao certo onde foi que nos perdemos, mas posso afirmar que nos perdemos em direcção e em perspectiva. Sentamos e desprezamos um legado muito valioso construído com muitas dificuldades. Tristemente, e talvez fruto da evolução e das dinâmicas sociais, históricas e até políticas, os meus (e nossos) heróis não mais fazem parte da actualidade informativa. As TV e rádios assumiram uma postura mercadológica e comercial, em que a audiência muitas vezes passiva e incauta consome e reencaminha sem criticar tudo o que se lhe oferece.

Hoje, olho com alguma nostalgia o fechar das cortinas e o apagar das luzes da boa comunicação, a comunicação que mais do que informar, formava cidadãos e pessoas, a comunicação exímia que respeitava a gramática, o léxico, a taxonomia das palavras, o verbo, a retórica, a oratória e toda a gama de condimentos que faziam das TV e Rádios espaços apetecíveis e desejados.

Novos players, novas filosofias, novas abordagens dominam o espaço informativo tanto público como privado, fazendo dos debates, análises e discussões um autêntico desfile de intervenientes despreparados que desinformam, desconstroem e deturpam a realidade das coisas.

O mercantilismo comunicativo e a monetarização da mídia levou-nos a um estágio em que aplaudimos o medíocre, o vulgar e o supérfluo. Hoje, o número de likes e reencaminhamentos vale mais que a essência didáctica, a estética, a ética responsável e comprometida.

Hoje, só escrevo para lamentar e manifestar a minha profunda e talvez insignificante nostalgia pelo rumo que tomamos, pela falta de uma ideia clara e ausência de um referencial e farol para a sociedade.

Batemos no fundo do poço, não por falta de referências do passado, mas por uma inércia e um amor cego à desconstrução das bases fundacionais de uma sociedade alicerçada nos valores da Ética, do bem fazer e do trabalho abnegado.

O espaço informativo e comunicativo perdeu muito, nos últimos tempos, e transformou-se numa espécie de dumba-nengue em que cada nhonguista faz a proposta e vende o seu produto, muitas vezes de qualidade duvidosa.

As nossas televisões mais se parecem com um lugar onde quem mais se expõe de forma irresponsável, mais visibilidade conquista. Perdemos o recalque e a ideia do bem-estar em público e para o público.

Disse!!!

 

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