O académico e filósofo Severino Ngoenha falava esta quinta-feira (24), em Maputo, na palestra sobre “Humanização, ética e deontologia profissional na formação em saúde e seu impacto na qualidade de atendimento”.
Ngoenha defende que os praticantes da medicina devem redescobrir a dimensão humana da profissão perante os pacientes que se apresentam diante deles.
Discursando, o académico disse que é preciso que aqueles que praticam a medicina, que muitas vezes podem estar cansados com operações, por receber doentes e que acabam tratando mal, redescubram a dimensão humana da própria profissão num mundo onde as clínicas só pensam em fazer dinheiro, num mundo em que os hospitais só pensam em ter dinheiro, num mundo onde os profissionais pensam em despachar de manhã o hospital público e para ir à tarde ao hospital privado. “É preciso redescobrir a dimensão humana da própria profissão, do rosto da pessoa que se esconde por detrás daquele que sofre e se apresenta diante dos profissionais da saúde”.
Dissertando, Ngoenha referiu que a medicina é humanismo e aqueles que trabalham nos hospitais com os seres humanos, antes de serem técnicos, antes de tratarem máquinas, têm a ver com relações com outros seres humanos.
“A primeira disciplina que todo o trabalhador do sector da saúde devia ter era o que significa ser homem, o que significa relacionar-se com outros homens, o que significa ser o intermediário do humanismo entre uma profissão e a comunidade humana a que nós pertencemos”.
Comentando sobre a função dos médicos, Ngoenha disse que é aquela que lida com dores e sofrimento e ela tinha de ser humanista e vista essencialmente como a possibilidade que os praticantes desses serviços têm de realizar a própria felicidade. Este humanismo não é espontâneo, tem de ser entendido, educado e transmitido.
Ele sugere a sociedade civil a não se limitar em realizar conferências para debater sobre este tema, mas que reintroduza na formação dos médicos e profissões inerentes, formações humanísticas.
“É preciso que as instituições que têm a função de gerir o trabalho dos hospitais, dos lugares médicos tenham este respiro, esta dimensão do humanismo e do valor supremo porque lidam com a vida e seus próprios valores da responsabilidade de que estão imbuídos no âmbito da formação dos profissionais de saúde”.
“A questão da moral e dos valores deve estar constantemente presente. Sugiro ainda que haja estágios anuais e reciclagens dos profissionais de saúde porque, depois de muito correrem, chega uma altura que estão cansados e o cansaço deles pode fazer com que esqueçam ou negligenciem a sua principal função de trazer felicidade aos outros seres humanos”, explicou.
Por sua vez, Edith Thuzine, representante do sector de humanização do Ministério da Saúde, lamentou o facto de ter sido abandonada a prática de exames psicotécnicos para admissão de um estudante de medicina. “Os médicos e os profissionais de saúde precisam de ser ensinados a saber ser e estar, deve ser feito um trabalho muito grande nos hospitais visto que, hoje em dia, vários pacientes vão à unidade sanitária e saem de lá sem saber o que tem”.
“Hoje em dia existem vários centros de formação em matéria de saúde e lá há falta de meios para o aprendizado, temos de procurar resgatar o que se fazia antes para as pessoas estudarem a medicina”, referiu.
Por seu turno, António Mate, representante da sociedade civil, garante que a actuação dos profissionais de saúde depende muito das políticas traçadas pelo governo para que possam ter impacto directo nas suas vidas a nível dos hospitais.
“É necessário que haja uma formação contínua dos profissionais de saúde para que possamos ver melhorias na prestação de serviços nos hospitais. Deve-se rever também os direitos do doente no país e conhecer elementos que possam penalizar e criminalizar os profissionais em relação ao mau atendimento”. (Marta Afonso)