Conhecemo-nos no bairro Samugue, na cidade dos Bons Sinais – Quelimane, capital da província da Zambézia, Moçambique. Sunil, rapaz com raízes machanganizadas e coração machuabonizado, cresceu em Quelimane. Éramos amantes da bola, amigos leais e brincalhões. Tão miúdos que éramos, mas sempre com ideias grandes. Vivíamos a vida na intensidade e com bons projectos de vida para o futuro. Sunil, era um rapaz bravo, filho de todos e amigo presente. Quis o anjo da morte obrigá-lo a parir a alma tão cedo e logo nos primeiros anos do século XXI: deixou-nos.
Num dia lindo, com o calor ardente da terra dos Bons Sinais, acabávamos de jogar a bola no campo da Escola primária e completa 25 de Junho de Quelimane, hoje onde funciona a Universidade Católica de Moçambique (UCM); saímos a pedalar numa bicicleta de marca hero em direcção ao bairro Janeiro, onde residiam umas namoradinhas; a viagem estava perfeita, alta velocidade, adrenalina elevada e vibrante.
No aludido dia dos primeiros anos da contagem do ano 2000, cruzamos o cemitério saudade, onde jazem os restos mortais do nosso amado Sunil – chegaremos lá nas próximas linhas! Noite quente, escuridão estratégica e estranha – coisa do diabo! Sem querer, atropelamos um cachorro vadio e com o vírus da raiva canina no sangue a ferver! O Sunil amava e criava cachorros – no seu quintal tinha vários…naquele dia, quis o destino que a raça dos cães não o reconhecesse – deixamos aquele vadio por trás – a viagem continuou em direcção às casas das donzelas.
Chegamos, brincamos por mais de duas horas. No nosso regresso, eis que o vadio reconheceu-nos e começou a seguir-nos, eu por detrás da bicicleta, o Sunil conduzindo – a, eis que o vadio deixou-me por trás e foi aos pés do Sunil e mordeu-o, tendo desaparecido após o acto.
Naquele momento ninguém percebeu, fomos para casa e dia seguinte é que o Sunil percebeu que havia sido mordido pelo canino, foi levado ao hospital, donde teria que cumprir uma medicação de seis doses de vacinas contra a raiva, mas o Sunil apenas cumpriu três – alegadamente porque alguém da família disse-lhe que o problema já estava ultrapassado e ele como criança, queria brincar apenas…90 dias passaram, a ferida e o veneno do canino já havia penetrado o robusto organismo do Sunil – estava com os sintomas raiva…
Foi levado ao Hospital Central de Quelimane – onde alguns médicos tentaram trocar o gato por lebre – tentaram vender uma cura que não existia - alimentavam as promessas da família em troca de dinheiro – mas já era tarde – o Sunil já ladrava que nem um canino faminto e sedento de sangue ou preza para morder – que situação! – dias passaram – todos se culpavam por não terem feito muito mais para salvar a vida daquele rapaz alegre e querido por todos no bairro de Samugue – Sunil perdeu a vida!
O bairro estava em choque – um bom rapaz inteligente, dedicado, sonhador e abnegado a boas causas havia partido do mundo dos vivos! A minha des-paixão por cachorros agudizou-se depois daquele acto, eles mataram o Sunil: o amigo que todos gostariam de ter e não perder!
Já nos tinhas acostumado
Co’licença quase todos dias ouvir e ler!
Eram teus talentosos dedos de Escriba de qualidade
Que rápidas e acertadas ejaculações pensantes desenhavam
E à Carta de Moçambique profundas análises encaminhava
As quais em nossos smartphones desembarcavam.
Já sabíamos que quando ecoasse o Co’licença
Os factos e eventos seriam, ainda que de humor misturados,
Sem subornos, repletos de mais nobres verdades
E de sabor literário escasso na Pérola do Índico, temperados.
Ó nobre Escriba,
Aos seus atenciosos ouvidos
Nada se passava despercebido:
Desde esquemas das batatas descartadas no mercado Zimpeto
Aos malabarismos dos repolhos que cabeceiam os tomates do corajoso médico
Tudo merecia sua cautelosa e atenção minuciosamente dobrada!
Ó nobre Escriba,
Seus dedos ousadamente descreviam
Aquilo que os tubarões a todo custo tentavam esconder
Debaixo do tapete das águas que escorrem dos seus escritórios
Confesso que a gente não estava preparado
Como se nunca esteve diante deste substantivo detestado
Ó morte, até quando serás a resposta por todos indesejada?
Quando nos chegou o som do bater das portas
Ouviu-se um Co’licença que não teve resposta imediata
E nesse intervalo de vai e vem, de buscas e consultas
Abrandava aos poucos, silenciosamente
Uma voz que ao mundo bramava audaciosamente
Fazendo jus à liberdade de manifestação e de expressão literária
Em beneplácito da racionalização e da prevalência da justa verdade!
Co’licença!
Foi a última vez que a porta soou...
Não a de uma entrada terrena feita de portas de madeira
Eram, na verdade, comportas do além que lentamente se abriam
Para receber um dos mais exímios Escribas de uma terra abandonada e em chamas
Cujo incêndio e desleixo, o Escriba, diariamente arrostava para seus corolários reduzir!
Co’licença!
Desta vez, quando a voz soou
Carregava consigo um adeus tristonho
Pois, certamente, muitos dos seus sonhos
Seus esperançosos olhos não puderam contemplar
Ademais,
O nobre Escriba parte na certeza de que a juventude,
Aquela que caminha entorpecida e txilladamente adormecida,
Fará o transplante da chama da sua vigorosa veia pensante
Definindo caminhos e alternativas de resposta acertadas
Para travar desafios que aos seus pares atormentam
E conduzir a Pérola do Índico ao porto desejado
Onde prevaleçam o mérito, a verdade, a coesão e justiça social!
Ó nobre Escriba,
Co’licença!
Jota de JESUS - Janato
Onde buscar forças quando a morte bate à porta?
É tão chocante dizer adeus, quando a morte nos tira do mundo dos vivos!
Lágrimas regam a alma do finado, mas o seu silêncio ainda atrometa;
A morte! Alimenta a terra com corpos que em vida eram valiosos;
Ninguém trava a morte! A vida é alegre, mas a morte traz o desespero;
A morte rima com a dor;
Quando ela chega, o amor morre!
Ninguém merece morrer, quando o ar que respiramos ainda nos procura…
Choro e remorso, dois aliados da morte;
Tanto corremos na vida que quando tombamos,
nada levamos…
porque em vida alimentamos diferenças?
Se quando chega à hora da morte, ninguém é diferente?
Onde buscar forças para alimentar a chama da vida quando um ente querido se vai…
Se o sofrimento que a morte trás nos torna incapaz de aguentar…
O tamanho das lembranças e vivências alegres e inesquecíveis…
Ah! Com a morte, ficam as lembranças e memórias tristes e alegres;
Morrer é deixar de existir fisicamente;
É abandonar involuntariamente a terra dos vivos…
É um recomeço de uma nova fase no além…
Viver vai além da morte,
É como dizia Epicuro, porque temer a morte, se "quando existimos, não existe a morte, e quando existe a morte, não existimos mais…"
Morrer é o oposto de viver…
É o fim do existir;
É um recomeçar;
É o momento de ser lembrado pelo lado bom do viver!
Morrer é o fim e o início da contagem da nossa história…
Omardine Omar – A morte – Maputo, 2021.
“We do not care how, just kick him out of the country…”, que numa tradução directa equivale a "não nos interessa como, apenas expulsem-no do País...!", foi o processo que tirou, aos rastos, o jornalista Tom do País. Segue o processo em forma de telenovela, pois só assim se pode relatar esse acontecimento que contou com diversos actores e cenários.
“We do not care how, just kick him out of the country…” foi assim que o Concílio de Maputo, composto por anciãos e sábios do País, determinou e seduziu as belas instituições governamentais a apressar um expediente nebuloso contra um escriba estrangeiro que já tinha raízes no solo nacional; ele incomodava as elites nos corredores diplomáticos, nas salas dos mercados e na corda dos investimentos. O desconforto surgiu, pois o homem e o órgão de comunicação social que representava mostravam uma cara de um Moçambique que pouco se conhecia.
- O problema é a língua que ele utiliza, incomoda-nos e a traz-nos prejuízos avultados; os outros até são mais agressivos e assertivos, mas escrevem em Português; uma língua que não é predominante em nossos negócios e nem os nossos principais parceiros de cooperação usam-na. Esses que nos abatem com o Português são pouco lidos lá fora. Esse estrangeiro com o seu Inglês nunca nos dá um minuto de sossego: Cabo Delgado aqui, Cabo Delgado acolá, Cabo Delgado isso e aquilo. Até tem um projecto, Cabo Ligado, que dizem estar a receber uns dólares mensalmente. Resolvam-nos isso, já!
- Mas chefe, o homem tem tudo organizado; o DIRE em dia e outros documentos legais segundo a nossa Lei.
- Não nos interessa, arranjem uma maneira e mandem-lhe embora deste País, nós é que libertamos e dirigimos isso. Ele não pode atrapalhar os nossos negócios.
- Excia, os jornalistas, activistas e organizações internacionais vão atirar-se para cima de nós e vão colocar-nos no lugar de um regime autoritário que constantemente ataca a liberdade de imprensa; isto vai linchar ainda mais a imagem do País em tudo que é relatório sobre democracia, liberdades ou direitos humanos.
– Isto sabemos… Estes sempre falam e o que acontece nunca chega ao público, apenas nós do Concílio é que ficamos com a informação.
- Vocês sabem como nós contornamos todos os escândalos neste País? Isto é de menos, pah! Estes todos vão falar nisso dois ou três dias e depois vai ser mais um caso como os outros. Não se preocupem com isso. Apenas expulsem-no. Porque já temos Savanas, Canais, Cartas, Magazines, CDD's, CIP's e outros que constantemente expõem-nos; agora vem esse estrangeiro, faz parceria com organizações da África do Sul e dos Estados Unidos de América e começa a expor todos os dias o nosso País? Guerra em Cabo Delgado, guerra em Cabo Delgado; como se o País todo estivesse em guerra, isso não podemos tolerar, “kick him out of the country...!"
- Chefe! Os impostos que a empresa paga e os trabalhadores de nacionalidade moçambicana que colaboram na empresa dele, como ficarão?
- Amigo! Tantas perguntas para quê? Nós já decidimos e vocês só têm de executar…
– Mas chefe…, o problema são os relatórios de organizações que vão manchar o País.
– Senhor! Já te disse que isto não nos interessa! Tu sabes, quantos moçambicanos já foram injustiçados para que certas coisas neste País caminhassem? Não te preocupes com eles, vão se virar. Resolvam este expediente.
- Desculpa Excia, mas não podemos fazer de outra forma? Como assim? Dar um susto nele ou na família dele para ver se muda! Ou mesmo acusar-lhe de um crime qualquer para ver se fica intimidado, como fizemos com os outros. Como o que aconteceu ao Amade Abubacar, Germano Adriano, Matias de Jesus, Fernando Veloso ou Omardine Omar… ou mesmo chefe, podemos levar o tipo para um "passeio turístico" pela cidade durante um dia inteiro ou mesmo no Chiango, conhecer um pouco, o "sabor do nosso bastão" ou até visitar a casa dele como fizemos a Nuvunga, Cortez, Mimbire e outros. São apenas ideias, Excia! "Em nome da nossa boa reputação".
- Amigo! Para os que foram nascidos aqui optamos por essas vias. São nossos assuntos internos e estamos a monitorá-los da nossa maneira. Em relação a este expediente, nós já mandamos vários avisos para este homem. Nossos homens da secreta foram para lá, aconselharam o homem e alguns colaboradores dele confiados que não estávamos a gostar, mas se quiseram fazer de irreverentes. Sentiam-se intocáveis porque a embaixada do seu País ia defendê-los, o MISA ou as organizações internacionais.
- Vamos vasculhar o homem, aquilo que encontraremos de mau, iremos usar imediatamente.
– Não precisa, jovem! Já temos o expediente todo, chamem-no e digam-no que não estamos a achar o registo da sua empresa, pelo que teremos que lhe retirar a acreditação de correspondente.
– Mas Excia, em relação a este aspecto sabe que a nossa Lei não fala de registo de websites ou blogs?
- Amigo, isso não nos interessa, eles não se dizem um órgão de comunicação social? Então, actuam o homem; se conseguirem podem expulsá-lo ainda hoje.
- Está bem Excia! Ordem dada, ordem cumprida…
Minutos depois
- Tom, bom dia, tudo bem?
- Estou bem. A que devo a honra de receber a chamada da ilustríssima?
- Temos um assunto muito sério a tratar. Venha amanhã ao nosso escritório às 08 horas.
Dia seguinte
- Tom, não estamos a achar o registo da tua empresa aqui em Moçambique e nem no website aparece esta informação, pelo que teremos de te retirar o Cartão de Jornalista que te atribuímos.
– Como? Tudo está em dia. Para além disso, no meu país de origem os órgãos de comunicação social não precisam destes todos elementos para funcionarem.
- Lá não é como aqui, já decidimos! Esperamos que nos facultes, agora, o cartão e tens dias para abandonar o País; dirija-se à Migração que eles querem falar consigo.
E o jornalista foi aos serviços de migração da cidade de Maputo sem nenhum documento. E chegado lá:
- O senhor é o tal do Tom de que tanto se fala…! Humm! Deves abandonar o País.
– Mas que mal fiz? O que há afinal?
- São ordens superiores e nós estamos apenas a executá-las.
- Vou recorrer porque esta é uma decisão ilegal e sem nenhum fundamento
– Senhor, o Concílio já decidiu e se insistires em ficar e desafiar-nos vamos mandar oficiais para a tua casa e serás arrastado como um ilegal. E terás um bónus: 10 anos sem pisar este País.
Caros concidadãos, o SARS-CoV-2, ou simplesmente COVID-19, é uma dura realidade. O vírus é voraz, os efeitos devastadores e pode levar à morte. O vírus existe e é invisível. Uma das perguntas que me foi feita e nunca terá resposta é: onde é que apanhou a COVID? Logo eu, cultor da máscara, do álcool em gel e um indivíduo que ganhou consciência da lavagem das mãos, várias vezes ao dia. Entretanto, a COVID-19 afectou-me.
Os primeiros sintomas (gripe) foram a 18 de Janeiro de 2021. O país registava um aumento exponencial de casos da doença, levando-me psicologicamente a pensar na possibilidade de estar infectado pela COVID-19. Tal como é comum, por estes dias, nas redes sociais, circulam inúmeras receitas caseiras. Eu optei por um xarope “tiro e queda” feito à base de gengibre, cebola, alho, limão, canela e mel – a única coisa doce no cocktail. Duas colheradas ao dia! Bem, não se trata de uma prescrição para ninguém, pois, nem sequer conheço o nível de toxidade ou de eficácia desse xarope caseiro. O certo é que acreditei na cura e lá fui tomando o xarope e a gripe passou. Escusado será dizer que experimentei os mais variados chás, xaropes e bafos! Depois vieram outros sintomas: fortes dores de cabeça e articulações, sintomas que sugeriam tratar-se de malária.
No dia 25 de Janeiro submeti-me a testes de COVID-19. Logo depois do teste, prescreveram-me azitromicina, predniselona, omeprazol, cefiximina, paracetamol, sulfato de zinco, vitaminas C e D. Os resultados só chegaram a 29 de Janeiro, no mesmo dia que decidi testar à malária. O teste revelou-se negativo. O hemograma e o HTZ eram normais. Ao principio da tarde, finalmente a confirmação do que mais temia: o teste positivo à terrível COVID-19. Vieram os meus medos, os meus receios e, mais tarde, o conformismo e a aceitação.
Na noite do dia 30, o quadro clínico agravou-se: começaram as dificuldades respiratórias. Literalmente faltava-me ar para respirar. À madrugada fui parar às urgências do Hospital Central de Maputo. A minha mente começou a desenhar um quadro sombrio. Pairava a morte. Por outro lado, a mente apaziguava com atenuantes como a idade e a ausência de comorbidade (qualquer patologia independente e adicional a uma outra existente num paciente), para além de existir uma taxa elevada de indivíduos que recuperam da doença.
A espera para um tratamento mais cuidoso era longa. O ponteiro do meu relógio estava parado! Só por volta das 10 horas eu e os outros doentes demos entrada à enfermaria de Cardio-pneumologia, transformada em enfermaria de trânsito para os doentes de COVID-19, no HCM. Ter uma cama naquela enfermaria não foi fácil. Foi preciso esperar toda a madrugada para que alguns doentes a desocupassem ou por alta ou por óbito. Terrível! O ambiente hospitalar era simplesmente aterrador. Conviver com dores, choros, gritos e mortes não foi fácil. Passou-se a primeira noite e eu sem sono.
Insuflado o oxigénio, “voltei à vida.” Ao fim do dia recebi alta hospitalar. Entretanto os episódios do dia anterior não me deixaram tranquilo. Os dias que se seguiram foram de insónias, devaneios, sustos e medo. Dois dias depois, voltei a ter falta de ar, consequentemente, nova baixa hospitalar. Ao princípio do dia 2 de Fevereiro estava novamente prostrado na sala de urgências do HCM. Quando finalmente as camas ficaram disponíveis fomos levados para a mesma enfermaria. Nem quero me lembrar do processo de transferência! A minha mente voltou a vislumbrar vários cenários: aquela sala transmitia medo, mas também tranquilidade. Medo porque o quadro clínico poderia se agravar e “evoluir para óbito”, como dizem os médicos; tranquilidade porque poderia receber oxigénio e cuidados médicos que me levassem a nova alta. À tarde, durante a medicação, um episódio voltaria marcar-me: repentinamente um doente piorou chegando a precisar de oxigénio. O pessoal em trabalho teve que recorrer, abruptamente, ao “meu oxigénio”, dai uma movimentação brusca da minha cama, em troca com a do doente grave. Assustei-me, a minha pulsação disparou em flecha. Passei a hipertenso. Naqueles dois dias, a minha tensão chegou a 184 de sistólica e 114 de diastólica! Por pouco não desenvolvi uma AVC ou mesmo um ataque cardíaco. Só Deus é quem sabe. E por falar em ajuda divida, a família toda e os amigos estavam em vigília. As correntes religiosas multiplicavam-se.
No dia 4, finalmente a alta hospitalar. Os médicos tinham uma certeza, “eu era hipertenso”, mas com sinais vitais estáveis, por isso, mesmo nada justificava que eu permanecesse no leito hospitalar e a ocupar um bem precioso: uma cama!
E como tinha que continuar a medicação em casa, para um “hipertenso”, o tratamento tinha que contemplar Amilodipina e Amilorido composto. Fiz o tratamento por um dia apenas, pois, a minha tensão voltou aos níveis considerados normais. Em casa, tinha que ficar em isolamento por 10 dias, ou seja, até 14 de Fevereiro. Durante o confinamento, as noites eram de insónia, resultante dos tristes episódios passados no hospital. Tive que passar por um tratamento psicológico (obrigado Psicóloga Adelina) até que o quadro voltasse à normalidade. Durante as sessões terapêuticas, a psicóloga chegou a recomendar que eu evitasse ter o telemóvel ligado e com razão. Algumas pessoas simplesmente teimavam em bombardear-me com notícias funestas ou fake news sobre a morte deste ou daquele. Há quem tem o enorme prazer de comunicar a morte do outro. Algumas chamadas eram mesmo para fazer perguntas ou comentários sobre onde e como terá sido contaminado, enfim…
A 15 de Fevereiro passei por novo teste e o resultado positivo chegou-me hoje, seguido do aconselhamento do pessoal da Direcção de Saúde da Cidade de Maputo – DSCM. Contada a minha história, e porque não apresento sintomatologia alguma, a DSCM recomenda que regresse à vida normal. E eu, por zelo e teimosia, estou na dúvida: será que estou livre da COVID-19? Afinal, que protoloco o MISAU segue para considerar um infectado pela COVID-19 livre da doença?
Antes de terminar as terríveis memórias passadas no leito hospitalar, quero elogiar o trabalho zeloso e abnegado dos profissionais da saúde. Mesmo com medo de contraírem a doença, os médicos não regateiam esforços para salvar a vida de quem está em apuros. Um aceno especial ao Dr. Stélio Nhavotso, um antigo aluno meu no ensino primário. Em poucos dias retribuiu o que eu lhe transmiti durante três ou quatro anos de convivência. Mesmo atarefado esteve sempre atento ao evoluir da minha situação, com visitas e chamadas constantes.
E porque não existe “nariz sem ranho”, há aqueles profissionais com medo até de ajudar aos enfermos, tratando-os com desdém.
A fechar mesmo, não estou aqui para amedrontar quem quer que seja, até porque a teoria do medo em pouco ajuda a “achatar a curva de contaminações por COVID-19.” Acredito que as pessoas só tem medo daquilo que vêem. Neste caso o vírus e invisível. O meu apelo é para que todos possamos assumir uma postura mais responsável na abordagem da doença, ou seja, para alem da adopção das habituais medidas de higienização, sair de casa se for absolutamente necessário, pois, quanto maior for o grau de exposição, maior e o risco de contágio!
Obrigado a todos pelas mensagens de conforto e pelas vossas orações. À família, o meu maior suporte, não há palavras para exprimir o que sinto!
Adão Matimbe (Jornalista Desportivo da Rádio Moçambique e docente na Escola de Comunicação e Artes, da Universidade Eduardo Mondlane)