A minha síntese está na timbila, é aqui onde todos os sentidos de mim se juntam e se unem, e produzem o remoínho que sou. Venho do mwenje, árvore dos meus antepassados, resistente aos temporais sem fim até hoje. É por isso que todos os movimentos que faço, sonorizam. Ou seja, a música da minha tribo sou eu. A dança também, sou eu.
Os festivais de timbila jamais serão realizados sem a minha participação, o meu corpo é o centro da engrenagem. Sou a matchatchulani elegida, direcciono o movimento das orquestras e mantenho a erecção espiritual dos insrumentistas, sou a catapulta deles. O meu ndjele (chocalho) não perde o rítmo, o compasso vem de mim.
Agora estamos em preparação do Msaho que vai acontecer daqui a pouco em Quissico, terra onde nasci numa manhã solarenta, e recebida com cânticos de pássaros poisados nas copas das árvores de fruta espalhadas em todo o perímetro da casa dos meus pais. É por isso que já estou em submissão ao ritual estabelecido para que nada falhe, meu marido não pode tocar-me por estes dias.
Mas eu fui feita para enlouquecer aos homens e às próprias mulheres, na rua ou em casa ou em qualquer lugar. Eu não sou esfinge, por isso não finjo. Cada movimento que faço é real como as águas despejadas pelas nascentes, toda a sensualidade está depositada em mim, é só ver como esvoaço nos palanques, sou o pássaro do passado, vou mover moínhos até nunca terminar.
A minha vocação é ser ao mesmo tempo porto de partida e porto de chegada, e vou mostrar tudo isso na festa que vai acontecer daqui a pouco, Não precisarei de vos dizer que sou eu, não proclamo a minha existência, não preciso, pois essa parte está reservada ao derramento de mim através da dança. Eu sou a dança dos chopi.
Nunca me importei com os nomes que me chamam, e eu nem sei aonde é que se localiza o Céu. O meu céu é o palco e as ruas e todos os lugares por onde passo espalhando o perfume de mulher chopi que valoriza o sexo, o sexo é o ponto final da humanidade, é por isso que depois do acto queremos dormir, já não há mais nada a fazer.
Sou a matchatchulani, mulher mais do que falada durante a vibração das orquestras e durante a ressaca, pela leveza e versatilidade que desnudo como as gazelas dançando nas planícies nas manhãs, em agredecimento ao Deus vivo pelo Sol que vai iluminar o dia inteiro. Eu também sou o sol dos chopi.
Espero por vocês daqui a pouco em Quissico. Tragam os corações abertos e prepararem-se para juntos sermos a albufeira onde se vai derramar todo o leite e mel da timbila.
“Nas eleições autárquicas, a opção deve ser pelos melhores, independentemente da sua filiação partidária, se o melhor cabeça-de-lista é da Renamo, não importa que eu seja da Frelimo, a bem do meu Município, devo votar naquele, se o melhor é da Frelimo e eu sou da Renamo idem. Está em causa a governação local, do meu bairro, minha autarquia, conheço as pessoas nele residentes e sei quem pode trazer solução para os problemas. Se os partidos políticos não propõem pessoas que nos convençam, como residentes, podemos nos organizar para nos candidatarmos para a liderança do nosso Município. Deve se dar primazia à decisão dos governados sem amarras políticas.”
AB
Como princípio consagrado, regra geral, quando falamos das eleições das Autarquias Locais, estamos a dizer que as pessoas escolhem, de entre si, aqueles que são os melhores para a Governação Local. É verdade que, segundo o nosso sistema de organização, os partidos políticos têm o privilégio de indicar candidatos, mas nada obsta que grupos de cidadãos se organizem para perseguirem esse interesse. Se os residentes de uma determinada Autarquia fossem bem organizados, até poderiam dar uma “boa lição” aos partidos políticos e não alinharem com o “nepotismo, amiguismo” na indicação do candidato.
Essa “boa lição” dá-se através da orientação do voto. É preciso notar que uma coisa é eleger alguém para a Assembleia Nacional e outra, bem diferente, é eleger alguém que vai dirigir o meu bairro, o meu quarteirão e as nossas dez casas. Essas pessoas são nossos vizinhos, vivem connosco e possuem mesmos problemas que todos nós. A questão é de olhar para o vizinho e/ou amigo e dizer “tudo bem, você avança para nos ajudar a resolver este e outro problema que nos afecta e te afecta também”. Aqui, caros compatriotas, a mensagem partidária não deve ser aquela que orienta o voto, se não aquilo que é a sensibilidade e conhecimento de cada um sobre os problemas do Município.
Se o seu partido X ou Y escolheu alguém que à partida sabe-se que não é capaz de levar o barco a bom porto, então, porque votar nele! Ainda que seja do seu partido? É que, ao agir assim, estarás a perpetuar os problemas locais e, quando se der conta, será tarde de mais para a reversão dos problemas. Sejamos objectivos e esclarecidos sobre o que queremos para as nossas autarquias. Não nos devemos deixar influenciar pela nossa filiação partidária, salvo se pudermos influenciar o partido a indicar aquele que para nos é o melhor dos melhores.
Na curta vivência que tive com o falecido António Simbine, Ex-Primeiro Secretário da Cidade de Maputo, ele dizia: “olha Buque, se a Frelimo teve problemas de Quadros entre 1975 a 1990, esse problema já não se coloca, o grande problema da Frelimo hoje é gerir Quadros pela quantidade e qualidade que tem” cito de memória. Para dizer que existem muitos Quadros nos Municípios com quem, por várias razões, os partidos não contam, mesmo por questões de gestão. São muitos, mas se o Município acha que aquele Quadro que foi preterido pelo partido é o melhor, porque não se organizar para candidata-lo!
Eu sei que a experiência não é boa e não abona a pessoas filiadas na Frelimo a ousar nisso. O exemplo vem da tentativa de candidatura do Samora Moisés Machel Júnior pelo PODEMOS, mas temos que ter fé. É importante mostrar ao partido que está a preterir os melhores Quadros em determinadas ocasiões e isso não significa, de forma alguma, estar contra o seu partido do “coração”. Nestas eleições autárquicas de 2023, parece-me que a sociedade civil está parcialmente “domada”, não aparece e nem sequer se sabe do seu pensamento nas diferentes Cidades e ou Vilas Autarcizadas. Dirão que foram impedidos, o tempo não espera!
Mulheres pouco visíveis a cabeça-de-lista!
Aqui, subscrevo a opinião da minha amiga Ana Maria Albino, quando diz: “as mulheres são a maioria neste país, mas são poucas as caras que aparecem como cabeças-de-lista”. É verdade, é preciso desmistificar isto e válido para todos os partidos políticos. As caras femininas são cada vez mais raras, mas as próprias mulheres são campeãs em “combaterem-se”, o que não abona em nada para a sua ascensão política de uma forma geral. Aqui, também, seria de aconselhar que as mulheres se fizessem ouvir nos seus partidos políticos e ou que se façam ouvir através das organizações locais para “atacarem” o poder.
A minha reflexão acima não deve deixar o partido Renamo e MDM sossegados, até porque, na minha opinião, estes dois partidos com assento parlamentar são os piores quando se trata de indicação de pessoas para lugares de destaque. Tanto na Renamo como no MDM existem pessoas sem nenhum histórico de militância político-partidário que chegam e ocupam lugares de destaque em detrimento dos que militam faz muito tempo. E para agravar a situação, nestes dois partidos não se fazem eleições sequer, é tudo ao “gosto” do chefe, isto, também, não nos levará a nenhum lugar.
Por isso repito, no seu Município, se a Frelimo acertou no candidato, se estás filiado à Renamo ou MDM, mas sabes que o candidato da Frelimo é o melhor no Município junte-se a ele, o mesmo pensamento é válido para quem é membro da Frelimo ou MDM, se o melhor candidato para o seu Município foi indicado pela Renamo, junte-se a ele e vote nele, MDM idem. O que pode piorar esta forma de eleição é o modelo de cabeça-de-lista, pois não permite que o seu partido esteja devidamente representado. Mas quem decidiu assim? Alguma vez te ouviram para a tomada dessa importante decisão no quadro eleitoral! Nada.
Adelino Buque
O povo foi demitido!!!
O povo foi demitido do seu papel de fiscalizador. Foi demitido de monitorar, de reclamar, de pedir para ter dignidade mínima.
Foi demitido de ser parte integrante do processo de governação da coisa pública. De ser um agente de participação, transformação e de mudança.
É triste, mas é a verdade. Chegamos a um estado de lamentação, consternação e lamuria em que o tanto fez é igual ao tanto faz. E agora parece que tudo é “swa fana” – na língua ronga – é mesma coisa.
O cansaço tomou conta; a frustração generalizou-se e a descrença tornou-se o respirar deste povo sonhador e lutador.
Como e quando isso aconteceu? De quem é a culpa? E como nos permitimos descer o penhasco desta forma, chegar quase no fundo sem estrondo, mas com impacto?
Na minha jovem trajectória, não tenho memória anterior de estar e participar em conversas várias, com diversas franjas sociais, e com alguma preocupação notar que o pulsar da apropriação nacionalista e patriótica esta em queda acentuada (não trago aqui nenhum barómetro capaz de servir como evidencia). As várias premissas foram paulatinamente me conduzindo a afirmar que o povo foi sendo demitido das suas tarefas principais.
O povo já sofrido e cioso de alguma mudança estrutural e estruturante, foi dando votos e confiança e, foi acreditando de forma cega na tão propalada mudança. Acreditou que a situação que vivia – boa ou má – era parte de um processo e de uma conjuntura histórica, política, económica e social, ou seja, era parte do processo de construção de um país novo. Alias, muitos de nós nascemos e crescemos sob a atmosfera de uma narrativa segundo a qual estamos num processo de construção e afirmação da nossa identidade enquanto povo. Processo este complexo e demorado que vai desde a conquista da tão sonhada e almejada independência aos nossos dias.
Um processo, diga-se, em que a tese principal era a expulsão do colono e da sua máquina opressora que chicoteava, humilhava, segregava e desumanizava o homem negro (moçambicano neste caso). A antítese era o direito a autodeterminação, o direito a liberdade de decidir os destinos do país.
A mítica noite de 25 de Junho de 1975 foi mais do que uma reunião de moçambicanos e moçambicanas no Estádio Machava. Foi o renascer e um inaugurar de uma página que se sabia de antemão nada fácil, mas desejável e necessária.
O povo enfrentou uma longa noite escura com os 16 anos da guerra civil – uma longa noite de horrores e dissabores. O mesmo povo chorou de alegria quando, em Roma se assinou o fim das hostilidades com um abraço fraterno entre dois irmãos outrora desavindos. Esse mesmo povo se fez as urnas de forma altamente patriótica e organizada para celebrar e contribuir para o lançamento das fundações basilares da nossa frágil e incipiente democracia.
De lá para cá, vimos de tudo um pouco; desde o empoderamento a marginalização do povo. O povo foi-se imunizando de esperanças, e se mascarando de crenças. Foi também se maquilhando de um cansaço disfarçado de força. Era importante estar alinhado e acreditar que o futuro e a mudança estava a chegar. Futuro este que até chegou – mas para alguns – novas elites emergiram e novas formas de exploração do homem pelo homem onde nacionais exploram e subjugam nacionais. Sedimentamos uma nova colonização com timbre local protagonizada por burgueses nacionais.
Entre avanços e retrocessos, vitorias e derrotas, júbilo e frustrações – um fenómeno ganhou forma – O Povo foi demitido!!!
A pobreza generalizou, as assimetrias agudizaram, a corrupção institucionalizou-se, as liberdades reduziram-se, o espaço cívico afunilou-se, e o povo começou a sentir-se estranho na sua própria terra.
A redistribuição da riqueza foi se tornando cada vez mais desigual; educação foi sendo paulatinamente escangalhada, saúde mais precária, emprego cada vez mais elitista, infraestruturas degradadas e inviáveis, transporte público paupérrimo, segurança publica caótica, raptos, crime, assaltos, etc. Alguns dos factos que trago para justificar a demissão do maior e mais valioso recurso de qualquer país.
E quem assinou a carta de demissão do povo? Que consequências essa demissão pode trazer?
Há quem diga em jeito de gozo: melhor mudar de país.
Há que questiona: Será que ainda somos um país?
Há quem indaga sobre o país e o legado que deixaremos às gerações vindouras; sobre o legado histórico e político, sobre a nossa soberania e sobre os limites do nosso endividamento.
Há quem prefere simplesmente olhar e calar.
Eu, na altura era Ministro para os Assuntos do Povo (ainda que sem despacho). Tinha um dossier muito vasto e complexo por analisar. Confesso que foi difícil ajuizar e tomar uma decisão que fosse de encontro com aquilo que havia sido exposto.
Precisava agir com sabedoria. E quando me preparava para assinar a carta que recebera do povo (do povo que também represento e sou parte), o sono acabou e o sonho terminou.
Ao analisar-se o entusiasmo em redor do Moçambola, facilmente se verifica que ele diminui do Norte para o Sul, de forma proporcional à distância. De Lichinga à Beira, o desporto-rei é uma loucura e os adeptos até dão espectáculo nas bancadas, monopolizando conversas e exacerbando paixões, algo que contrasta com a capital do país, onde apesar de haverem os melhores estádios e transportes, as bancadas ficam “às moscas”, mesmo em dia de derby.
Em contra-ponto, na capital, em dia de embate Manchester City-Barcelona, Benfica-FC do Porto e outros, os adeptos vestem camisolas e bonés dessas equipas e vibram até à exaustão.
Fica claro que para estes, o estatuto do futebol interno e do desporto em geral, é uma coisa menor, um “xitututu” (barulho de uma motorizada), incapaz de ser factor de atracção.
DE FORMADOR A ESPECTADOR
Recordam-se os mais velhos, que o Norte e o Centro, eram os viveiros e fornecedores da base das selecções nacionais no pós-Independência. Cito algumas estrelas: Nuro Americano, José Luís, Chiquinho Conde, Rui Marcos, Paulito, Jójó e outros. Porém, hoje vivem do recrutamento de treinadores de Maputo, que por sua vez impõem a contratação de jogadores do Sul. Os plantéis ficam completos com o recrutamento de futebolistas nos países vizinhos, muitos deles de categoria duvidosa.
E porque os clubes vivem dos orçamentos das empresas e não da publicidade e quotas dos associados, importa apresentar resultados imediatos, para justificar novos desembolsos.
O principal “cancro” da formação? Após terem sido “bisnados” – na sua maioria - os espaços vazios, campos e pavilhões, o que escapou tem como prioridade o aluguer a reuniões políticas, cerimónias religiosas e espectáculos musicais. As futuras estrelas que optem pelos “games” nos celulares.
Quanto ao futuro dos Mambas? Ressalvando as excepcões, a prioridade para sermos competitivos passa pela naturalização de jovens descendentes de segunda e terceira geração de cidadãos nascidos em Moçambique!
Uma pobre herança para estrelas como Eusébio, Coluna, Armando Manhiça, Hilário, Mário Wilson, moçambicanos de raiz que levaram o nome da antiga colónia portuguesa ao Mundo.