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quarta-feira, 16 janeiro 2019 08:59

Ministro da Justiça toma decisão ilegal: classe dos conservadores em polvorosa

Os conservadores em Maputo estão em polvorosa! Tudo porque o Ministro da Justiça, Assuntos Constitucionais e Religiosos, Joaquim Veríssimo, emitiu a 20 de Novembro último uma circular que transfere o processo de reserva de nome e do registo da constituição de sociedades da Conservatória dos Registos das Entidades Legais (CREL) para o Balcão de Atendimento Único (BAÚ). A medida visa, segundo nos disse há dias Lubélia Muiuane, Directora da CREL, flexibilizar e simplificar o processo de constituição de empresas na Cidade de Maputo.

 

“Carta” apurou, no entanto, que o Diploma Ministerial que entrou em vigor no dia 2 de Janeiro do presente ano, em Maputo, viola o quadro legal: não cabe ao Ministro anular um Decreto-Lei, mas sim ao Conselho de Ministros – conforme determinam as normas de funcionamento dos serviços da Administração Pública em Moçambique. 

 

Um breve parecer legal obtido pelo nosso jornal foi claro e sucinto: no máximo, o que o Ministro podia fazer era, por diploma ministerial e ouvido o Governador da Província (neste caso a Governadora da Cidade), atribuir as competências ao BAÚ, mas sem retirar a competência das conservatórias. A decisão apanhou a classe dos conservadores desprevenida. Um grupo deles já enviou ao Ministro uma reclamação com questões a respeito da circular assinada pelo titular da pasta da Justiça, sugerindo que ele “corrija” a medida.

 

Os conservadores em Maputo chamam a atenção de Veríssimo para o facto de que a medida só podia ter sido emanada por meio de um Decreto-Lei, atendendo que o Registo de Entidades Legais foi criado a 3 de Maio de 2006, através de um Decreto-Lei, e não pode ser revogada por um acto normativo hierarquicamente inferior; que seja feita uma revisão de todo quadro normativo relativo ao registo comercial, por forma a adequar os objectivos pretendidos à legislação vigente no Código Comercial de 30 de Maio de 2007, que cria os BAUs. Desconhece-se a reação de Veríssimo. “Carta” não conseguiu contactá-lo ontem.

 

O debate sobre a justeza ou ilegalidade da medida vai continuar nos próximos tempos. Veríssimo está sendo apelidado de um “arrogante” que sequer dá ouvidos a seus conselheiros jurídicos. Sua medida enquadra-se naquelas reformas destinadas a melhorar o ambiente de negócios em Moçambique. Mas parece que foi tomada de forma precipitada. “Carta” fez uma visita à CREL, no prédio Fonte Azul em Maputo, e ao BAU.  Na CREL os conservadores estão praticamente sem trabalho, no que se refere à emissão de certidões negativas. Em contradição com as salas vazias das instalações da CREL, regista-se uma demanda incomum no BAU da Avenida Josina Machel, que esbarra com a falta de domínio dos novos processos por parte dos técnicos e a queda constante do sistema informático, deixando os utentes em longas filas à espera de efectuar uma simples reserva para constituição de empresas. Alguns estavam, ontem, com os nervos à flor da pele.

 

Os utentes não têm informação sobre o que está a acontecer. Manuel Henriques e Anabela Macamo, dois cidadãos que pretendiam efectuar reserva inicial de nomes para seus projectos empresariais, mas que não puderam porque o sistema parou repentinamente, criando longas filas de espera, estavam com os semblantes carregados de zanga. Para Manuel Henriques, a morosidade é que é preocupante. “Cheguei aqui às 9 horas e esperava ter sido atendido, mas o que verifiquei foi que a fila nunca andava e os funcionários não dizem nada”. Enquanto isso, Anabela Macamo disse que estas mudanças deveriam ser acompanhadas pelo aumento de técnicos e das condições de trabalho, de quem está ligado a este processo (de reserva de nome de empresas). 

 

Entretanto, “Carta” apurou que o problema não é apenas a lentidão ou queda do sistema; mas sim o domínio do mesmo por parte dos técnicos do BAU. Em suma, para já, a medida tem se revelado um tiro pela culatra: ao invés de acelerar processos e facilitar os utentes, estes perdem mais tempo. Mas a medida ilegal de Veríssimo tem outras nuances curiosas. Uma fonte disse-nos que a razão da zanga dos conservadores não decorre apenas do facto de terem ficado com menos trabalho. Tem sobretudo a ver com a perda das receitas que as conservatórias faziam com a cobrança de emolumentos, nomeadamente as taxas que os utentes pagam para a tramitação de documentos relevantes. A receita com emolumentos é canalizada ao Cofre dos Registos e Notariado, uma entidade cuja gestão nunca foi transparente e depende directamente do poder discricionário do Ministro da tutela.

 

Mas a receita é também distribuída, como renda (participação emolumentar), entre conservadores e funcionários. Essa participação emolumentar foi inaugurada com um despacho de 1989, quando se desfez o antigo Cofre Geral de Justiça, em que havia também uma participação emolumentar para todos os funcionários dos tribunais e dos registos e notariado, tendo-se criado o Cofre dos Tribunais e o Cofre dos Registos e Notariado, cada um para cada sector. 

 

Num Despacho, de 1991, o Governo fez a actualização de quanto cabe a cada funcionário dos Registos e Notariado em função da receita mensal. Nos últimos anos, a tabela de emolumentos tem sido aumentada sistematicamente, incrementando o fardo de despesas para os cidadãos. Com a medida de Veríssimo, não fica claro quem vai gerir a receita emolumentar dos actos administrativos agora transferidos para o BAU.  O caso, nomeadamente, uma ilegalidade praticada por um Ministro da Justiça tem sido motivo de chacota. Alude-se a gritantes níveis de incompetência marcando a gestão de alguns ministros de Filipe Nyusi. Joaquim Veríssimo é descrito como o exemplo acabado de um ministro sentado numa cadeira errada. (Omardine Omar) 

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