A neutralidade de Moçambique perante o conflito armado que opõe a Rússia e a Ucrânia, no leste europeu, continua a agitar o país e o mundo, sobretudo após o Governo se ter abstido novamente na votação contra Rússia como membro do Conselho dos Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas. A primeira, lembre-se, tinha sido na condenação à invasão russa àquele país europeu.
Enquanto alguns criticam a opção tomada pelo Governo, a antiga Primeira-Dama da República de Moçambique e actual activista dos direitos humanos, Graça Machel, considera acertada a posição assumida pelo Executivo de Filipe Jacinto Nyusi.
Para Graça Machel, há questões por detrás do conflito que não são levadas à mesa de debate, pelo que o país não pode alinhar nem num e noutro lado. “O governo está a fazer muito bem em abster-se nesta votação. Há muitas outras questões que estão por detrás daquilo que levou a este conflito que não estão a ser postas em cima da mesa”, defende.
Sustentando a sua tese, Graça Machel aponta, por exemplo, o aumento do número de países que optam, cada vez mais, pela neutralidade nas votações realizadas em sede da Organização das Nações Unidas.
“O número de países, nas Nações Unidas, que se absteve, está a aumentar à medida que temos mais consciência dos outros factores que não estão a ser postos em cima da mesa”, afirmou, em referência ao aumento, de 35 para 58, o número de países que se abstiveram na última votação.
Lembre-se que, aquando da aprovação da resolução que condena a invasão russa na Ucrânia, dos 193 Estados-membros das Nações Unidas, 35 abstiveram-se e cinco votaram contra. Já na última votação, que teve lugar semana finda e que visava suspender a Rússia como membro do Conselho dos Direitos Humanos daquela Organização, o número de abstenções subiu para 58 e de votos contra aumentou para 24.
Segundo a viúva de Samora Machel, o país não pode ser obrigado a tomar qualquer posição sobre o conflito, pelo que quem quiser criar parcerias “tem de respeitar as posições soberanas” tomadas pelo Governo. “Dependendo dos interesses nacionais, em cada caso, nós vamos decidir em que lado votamos”, rematou.
Na entrevista que deu aos jornalistas, à margem de uma conferência na cidade de Maputo, no âmbito da passagem do Dia Internacional Contra Utilização de Criança-Soldado, Machel disse estar com saudades do “Movimento de Países Não Alinhados”, uma associação de países que, durante a guerra fria, não tinham compromisso formal com qualquer dos dois poderosos blocos antagónicos: Estados Unidos da América e ex-União Soviética.
“Se houvesse liderança pujante, nos nossos tempos, era importante reactivarmos aquele movimento dos «Não Alinhados». Nós não somos forçados a estar aqui ou lá”, sublinhou.
Refira-se que a guerra entre a Rússia e a Ucrânia, que dura há mais de um mês, já causou a morte de mais de 1.100 civis e feriu mais de 1.650. Cerca de 4 milhões de pessoas já saíram da Ucrânia e perto de 13 milhões necessitam de assistência humanitária naquele país. (Carta)