O desmoronamento do Textáfrica de Chimoio jamais será um caso isolado, está inserido num contexto em que todo o futebol moçambicano perdeu o entusiasmo dos tempos. Ou seja, nos primórdios da independência nacional, o nosso país era um imenso alfobre futebolístico, com tendência a inesgotável, mas é reduntante dizer isso. Era um transbordante estendal com jogadores de topo, talhados naturalmente para grandes exibições em qualquer parte do mundo, e eles mostravam esse talento nos campos sempre abarrotados, e assim, todos nós acreditávamos que na senda de Eusébio, Coluna, Matateu, Vicente, Matine e outros tantos, seriam estes a embarcar em outros voos. Enganamo-nos!
Jogadores como Orlando Conde, Ângelo Jerónimo, Chababe, Luís Siquice, Terezo, Chinguia, Guiló, Cifrónio, Babarriba, Lóngwè, Marcos I, Marcos II, para citar apenas alguns exemplos dentro de um manancial vibrante sem fim que Moçambique já teve, terão sido injustiçados pela história, impedidos de brilhar noutras galáxias. Fecharam-lhes as portas da luz, então não tiveram outra saída que não fosse a resignação, mesmo assim sem perder a dignidade. Levantaram, em ocasiões infinitas, o Estádio da Machava e muitos outros campos espalhados pelo país, até que as pernas sossobraram. Deixando para trás o seu labor indelével, que será recordado para sempre.
Porém, o que nós não sabíamos e nem esperávamos, era que esses “craques” seriam a última carrada, pois, depois deles os dias de sol começaram a fenecer, até hoje que não temos certeza do futuro, a não ser que Reinildo Mandava reacenda a chama da nossa esperança e fazer-nos acreditar, novamente, que Moçambique é um país de grandes jogadores de futebol.
Nesse tempo de ouro nem sequer precisávamos de televisão, não tinhamos. Bastavam-nos os relatos de João de Sousa, Anuar Mussagy, Saíde Omar e o Domingos Naene para que, na impossibilidade de estar no terreno, acompanhassemos tudo em grupos de amigos, gritando em delírio como se também estivéssemos lá. Eram tempos de glória, corporizados por finas coqueluches. Conheciámos a todos pelos nomes e acreditávamos nas suas capacidades de tornar as partidas em poesia que será declamada do Rovuma ao Maputo. Para gáudio do próprio futebol.
Não haverá nenhum jogo no Estádio da Machava que não seja precedido de romaria. As pessoas, na falta de transporte, iam a pé, ocupando literalmente as bermas das estradas que vão dar ao vale do Infulene. A festa era exalada antes de o jogo começar, numa postura de pátria nunca vista. A Federação Moçambicana de Futebol tinha os seus “sócios” com “bancada-sol” reservada para que o remoínho ressurgisse. Outros, que não terão acesso ao recinto, vão se pendurar nos postes de electricidade lá fora. Mas esse é o resultado da força que o futebol tinha nesse tempo.
Depois, provavelmente a partir dos finais de oitenta e princípios de noventa, a euforia que dava sentido à nossa vida começou a esboroar-se. Fomos ficando sem a quem seguir como ídolo. Os campos foram perdendo o chamaris. Mesmo com a construção do Estádio Nacional do Zimpeto, não haverá motivo para lá ir, salvo em pouquíssimas ocasiões, mais por aliciamento da publicidade, do que propriamente pela crença de que teremos os nossos jogadores a cintilarem. Não é o “Zimpeto” que joga, são os jogadores. Que entretanto já não nos fazem acreditar no futuro.
Pode ser que os procedimentos de justiça na vara comercial do Tribunal Superior de Londres estejam a ser transparentes para as partes envolvidas – juiz Robin Knowles conferencia com todos sobre o avanço do processo e é assertivo nas suas decisões quando as comunica aos directamente interessados – mas o Tribunal Superior de Londres, dizia, não está a ser transparente para a sociedade moçambicana, a principal vítima do calote de 2 mil milhões de USD – com custos estimados para Moçambique na ordem dos 11 mil milhões de USD (ver Custos e Consequências das Dívidas Ocultas para Moçambique Edson Cortês, Aslak Orre, et. al – 2021- Bergen & Maputo: Chr. Michelsen Institute/CIP).
Os efeitos colaterais do calote podem ter custado a Moçambique USD 11 biliões – quase todo o PIB do país em 2016 – e quase 2 milhões de pessoas foram empurradas para a pobreza, diz o estudo.
O que está em causa em Londres são os interesses (e o futuro) de milhões e milhões de moçambicanos, e não apenas os interesses e o futuro de uma meia dúzia das elites políticas locais envolvidas na trama. E, em certa medida, os interesses da sociedade moçambicana não estão representados em Londres.
O juiz Knowles devia saber que nem sempre os interesses imediatos dos representantes do nosso Estado correspondem aos interesses estruturantes da sociedade moçambicana. Há um desfasamento entre Sociedade e Estado. O Estado representa, muitas das vezes, uma pequena minoria elitista virada para a acumulação e enriquecimento à custa da sociedade. Foi o que aconteceu com o calote.
De como que a sociedade moçambicana não está necessariamente representada em Londres.
A nossa PGR ainda precisa de mostrar que pratica a transparência, pois a mesma PGR que convocou uma conferência de imprensa há dias, onde disse quanto já gastou com escritórios de advogados em Londres, nunca convocou uma conferência de imprensa para dizer quanto gastou com o escritório Mabunda Inc. em Joanesburgo, para tentar trazer Manuel Chang para Moçambique. Quanto foi?
A PGR foi assertiva quando anunciou o acordo entre o Estado e o Credit Suisse (UBS), mas agora parece que voltou a cobrir-se do mesmo véu de secretismo que sempre vestiu.
Ontem, de Londres chegou um despacho da Reuters dizendo que Moçambique desistiu de uma parte significativa da sua reclamação contra o construtor naval franco-libanês, Privinvest, citando o advogado Jonathan Adkin (Serie Court), que representa a PGR no caso contra a turma do Iskandar Safa. Jonathan Adkin disse que Moçambique desistia da reivindicação de mais de 800 milhões de USD da Privinvest por “perdas macroeconómicas”.
Mas Moçambique abdicou porquê mesmo? Qual foi o racional? Quais os ganhos? No caso do Credit Suisse, o ganho foi um extensivo cancelamento da dívida, de cerca de 600 milhões de USD. E no caso vertente? Qual foi o quid pro quo? Isto não foi ainda explicado detalhadamente nem por Adkin e muito menos pela nossa PGR.
A Reuters citava, também ontem, o advogado da Privinvest, Duncan Matthews, dizendo que Moçambique abandonou o caso contra a Privinvest porque era "inútil" e teria levado a um interrogatório "profundamente embaraçoso" das testemunhas arroladas pela PGR.
Quem são as testemunhas de Moçambique no caso contra a Privinvest?
Das incidências de ontem, o mais espantoso foi o que veio vertido num despacho da Lusa, que rezava assim: o grupo naval Privinvest prescinde de chamar o Presidente moçambicano, Filipe Nyusi, como testemunha no julgamento sobre o caso das dívidas ocultas de Moçambique no Tribunal Comercial de Londres. “Concluímos que não vamos envolver o Presidente Nyusi”, afirmou Duncan Matthews, advogado da Privinvest, falando ao Tribunal.
O que se está a passar em Londres? Moçambique prescinde da Privinvest e esta prescinde da sua obsessão de arrastar o Presidente Nyusi? Como assim? Há um acordo secreto em curso entre a PGR e a Privinvest? Se há, onde é que ficam os interesses da sociedade nesse eventual acordo? Este acordo é uma consequência directa do acordo com o Credit Suisse? Terá o Credit Suisse exigido que assim fosse?
A Privinvest confessou ter subornado (se bem que eles falem em taxa de sucesso) funcionários do Estado moçambicano e do Credit Suisse (estes confessaram em sede de justiça americana que receberam subornos). Ou seja, a Privinvest esteve no centro do calote. Ora, ao abdicar do processo contra a Privinvest, não estaria a PGR também retirando toda a substância ao caso local das “Dívidas Ocultas”?
Se o principal caloteiro, corruptor activo, é perdoado por Moçambique, por que razão quem recebeu suborno, esteve na planilha do Boustani, comprou carros e casas, vai ser mantido em prisão? Falo dos Ndambis, dos Nhangumeles desta vida e companhia.
Ou, depois das eleições autárquicas, vai todo o mundo ser liberto por seus prazos de prisão preventiva estarem precludidos há demasiado tempo? E de repente fica todo o mundo impune, mas nada muda na vida dos milhões de moçambicanos que foram as principais vítimas deste calote. Abdicamos de cobrar a Privinvest, mas continuaremos a pagar milhões e milhões de uma dívida odiosa. Será este o nosso fim? Afinal, o que está a acontecer em Londres?
Assinaram-se os acordos gerais de paz, em 1992, e até hoje nunca ouvi uma mínima voz humildando-se e pedindo desculpas pelos horrores dessa estúpida guerra. Ninguém, até hoje, já procurou mediadores para preparem os acordos de pedido de desculpas às milhares de famílias destruídas e fuziladas em nome do desenvolvimento, democracia e marxismo. Ninguém!
Quem já pediu desculpas ao Rogério Dimande, meu antigo professor, que foi higienizado as duas mãos por uma catana, enquanto assistia aos seus pais sendo deslocados vivos por uma corda para as profundezas de uma latrina? Quem já pediu desculpas a mim, pelos setenta e tal familiares meus fuzilados no Massacre de Homoíne?
Não falo da Frelimo, da Renamo, do Governo, falo do pedido de desculpas que nunca ouvi, falo das acusações que todos trocam sem se dar um minuto para arrancar a dentadura do silêncio e colocar entre as gengivas uma simples frase: “pedimos desculpas a todos pelas mortes”.
De 1992 até cá, quem já se humildou, quem já condecorou com um pedido de desculpas a milhares de crianças, que hoje são pais, que cresceram sem saber o peso, a doçura das palavras pai, mãe na boca? Como alguém que nunca teve um pai pode ser um pai?
Em outros feriados, assistimos condecorações, distribuição de medalhas de mérito e coragem, graduação infantil de heróis. E hoje, 04 de Outubro, quem merece tudo isso? Haverá coragem de chamar todas as vítimas dessa guerra, sacudi-las o peso da morte e enchê-las de condecorações, medalhas e certificados? Haverá coragem de reconhecer que são heróis as crianças que cresceram sem pais, as viúvas que envelhecem sem saber dos corpos dos maridos e as famílias que até hoje tentam ter paz?
Haverá coragem de pedir desculpas a milhares de crianças que foram armadas e obrigadas a matar, aos massacrados e queimados vivos que nem em Roma foram chamados para pelo menos dizer: “vamos pensar no vosso pedido de desculpas”. Podia falar dos massacres, das mulheres estupradas e assassinadas, das mulheres que hoje criam filhos que fizeram nas matas em troca de um naco de segurança, mas falo de um simples pedido de desculpas.
A guerra civil acabou, mas quem já confessou que matou e pede desculpas? Quem, dos fazedores da guerra civil, já parou um minuto para confessar um pecado, um crime e apontar uma vala comum qualquer que ajudou a cavar? Quem desses chefes já parou um instante para orar, não pela democracia, não pelo desenvolvimento, não pelo marxismo, mas pelas pessoas que matou. Quem, embezerrado de arrependimento, pediu desculpas pelas minas que serraram pernas e transformaram em pó a vida de muitos moçambicanos? Quem já se humildou?
“Em termos mais objectivos, Moçambique não conhece a PAZ desde o ano 1498, altura em que os portugueses escalaram o país, pese embora, a exploração e expansão efectiva se tenha dado no século XIX. A Luta para a Libertação de Moçambique teve início a 25 de Setembro de 1964 e os Acordos para a Independência a 07 de Setembro de 1975.
Depois do Colonialismo Português, seguiu-se a Guerra patrocinada por estrangeiros, mas que eram os moçambicanos a matarem-se uns aos outros. Esta guerra teve início a 30 de Maio de 1977, cujos acordos definitivos foram assinados a 06 de Agosto de 2019 entre o Governo de Moçambique e a Resistência Nacional Moçambicana, o chamado Acordo Definitivo de Paz".
AB
Moçambique conheceu o início da ocupação portuguesa em 1498, mas seria no Século XIX que inicia uma exploração intensiva das colónias africanas, devido à perda de influência no Brasil e na Índia. É preciso notar que desde a ocupação portuguesa em 1498, Portugal nunca tinha enfrentado uma revolta digna desse nome, sendo em 1961 a primeira vez em que há uma insurreição armada em Angola. Em Moçambique, a insurreição armada teve início a 25 de Setembro de 1964, na nortenha província de Cabo Delgado.
A luta de Libertação Nacional teve como seu presidente o Dr. Eduardo Chivambo Mondlane e seu vice-presidente o Reverendo Uria Simango. Por motivações que, sendo relevantes, não serão abordados nesta reflexão sobre “os difíceis caminhos para a paz em Moçambique”, a FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique e o Governo Colonial Fascista Português viriam a assinar o Acordo de Lusaka em Setembro de 1974, que deu lugar à declaração de cessação de guerra a 08 de Setembro de 1974.
Nos acordos de Lusaka, entre a FRELIMO e o Governo Colonial Fascista Português, estabelecia-se o calendário da Independência Nacional, que passava pela criação do Governo de Transição, que teve como líder Joaquim Alberto Chissano. Como disse antes, a insurreição armada foi declarada pelo Dr. Eduardo Chivambo Mondlane e os Acordos de Lusaka foram assinados por Samora Moisés Machel, sendo seu vice-presidente Marcelino dos Santos.
A independência Nacional viria a ser proclamada a 25 de Junho de 1975, pelo Presidente da FRELIMO, Samora Moisés Machel, e a designação do Estado Moçambicano seria a de República Popular de Moçambique. Esta decisão da FRELIMO criou alguma instabilidade no seio da comunidade portuguesa que receava pelas relações com o novo Governo e estima-se que aproximadamente 170 mil portugueses se teriam retirado de Moçambique, sendo que alguns foram para Portugal e outros refugiaram-se nos países vizinhos como a África do Sul, Rodésia de Ian Smith e Malawi. Seria, precisamente, na Rodésia de Ian Smith onde decidem organizar-se para lutarem contra a independência de Moçambique.
Desta decisão, resultara a criação da RENAMO – Resistência Nacional Moçambicana, que teve como seu primeiro líder André Matade Matsangaissa. Esta guerra tem início a 30 de Maio de 1977 e o apoio logístico foi patrocinado pela Rodésia de Ian Smith. Repare que o início da Guerra entre o Governo da República Popular de Moçambique e a RENAMO – Resistência Nacional Moçambicana acontece em menos de dois anos de independência nacional. O suporte humano foi totalmente moçambicano, começou com um pequeno contingente e muito rapidamente atingiu números astronómicos!
No ano de 1980, a Rodésia de Ian Smith colapsa e a ZANU proclama a independência. A Rodésia passou a chamar-se Zimbabwe e a RENAMO foi obrigada a retirar-se daquele território para a África do Sul do Apartheid. Com a intensificação dos combates, o Governo de Moçambique decide estabelecer o Acordo de Paz com o Regime da África do Sul do Apartheid, que foi assinado a 16 de Março de 1984. O acordo previa, entre outros, a cessação do apoio à RENAMO por parte da África do Sul, o que não chegou a acontecer, pois, a África do Sul intensificou o apoio e a RENAMO por esta altura chegou aos 20 mil homens. Veja abaixo os alvos preferenciais da RENAMO e o trabalho que o Presidente Samora Moisés Machel realizou em contrapartida.
“A Renamo atacou um grande número de entidades governamentais, tais como administrações distritais, escolas e hospitais. Além disso, destruiu também várias estradas e vias de comunicação. Estas acções tiveram um enorme papel desestabilizador na economia, uma vez que não só obrigaram o governo a concentrar importantes recursos numa máquina de guerra, mas principalmente porque levaram ao êxodo de muitos milhares de pessoas do campo para as cidades e para os países vizinhos, diminuindo assim a produção agrícola.
Em Dezembro do mesmo ano (1986), o presidente Samora Machel teve um encontro internacional em Lusaka, Zâmbia, com Hastings Banda, Kenneth Kaunda e Robert Mugabe, presidentes do Malawi, Zâmbia e Zimbabwe, respectivamente. Machel conseguiu convencer Banda a cessar o seu apoio à Renamo. Na sua viagem de regresso a Moçambique, o Tupolev Tu-134, avião cedido pela União Soviética no qual Machel viajava, junto com muitos dos seus colaboradores, despenhou-se em Mbuzini, nos montes Libombos, localizados em território sul-africano próximo à fronteira com Moçambique. O acidente foi atribuído a erros do piloto russo, mas ficou provado que este tinha seguido um rádio-farol, cuja origem não foi determinada. Este facto levou a especulações sobre uma possível cumplicidade do governo sul-africano. Então, Joaquim Chissano foi eleito como o sucessor de Machel. Chissano era Ministro dos Negócios Estrangeiros desde 1975”.
In Wilkipedia, Enciclopédia Livre, Guerra Civil em Moçambique
Com a morte do Presidente Samora Moisés Machel e sua comitiva, nas colinas de Mbuzini, na África do Sul, a Frelimo decide indicar Joaquim Alberto Chissano para Presidente da Frelimo e da República Popular de Moçambique e este continua com as políticas de busca de Paz iniciadas pelo Presidente Samora Moisés Machel e intensifica a aproximação com a Renamo, o que culminaria com a indicação de Delegações de Alto nível por parte do Governo de Moçambique, liderada por Armando Emílio Guebuza e da parte da Renamo por Raul Domingos que em Roma trabalharam para o alcance da Paz, cujo acordo seria assinado a 04 de Outubro de 1992.
O Acordo Geral de Paz teve como protagonistas o Presidente da Renamo, Afonso Macacho Marceta Dhlakama, e o Presidente da República, Joaquim Alberto Chissano. Um dos passos importantes que o Governo teve de dar foi a Revisão da Constituição da República, abrindo espaço para a economia do mercado e o multipartidarismo em Moçambique. De referir que já estava em curso a implementação do PRE - Programa de Reabilitação Económica, em que o Estado Moçambicano abdicou da gestão da economia, cedendo ao sector privado e, na área de habitação, a APIE- Administração do Parque Imobiliário do Estado vende as casas aos seus inquilinos, de entre vários condicionalismos impostos pelo Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional.
O Acordo Geral de Paz também abriu espaço para as eleições periódicas, no caso, de cinco em cinco anos. As primeiras aconteceram em 1994, ganhas pela Frelimo e seu candidato Joaquim Alberto Chissano, tendo ficado para atrás Afonso Dhlakama da Renamo. Nas segundas, a Frelimo e Joaquim Chissano voltaram a ganhar e a Renamo e Afonso Dhlakama voltaram a perder. Nas terceiras, o candidato da Frelimo foi Armando Emílio Guebuza e da Renamo continuou Afonso Dhlakama, que voltaria a perde-las mais uma vez, tendo perdido nas seguintes, igualmente, com o candidato da Frelimo Armando Emílio Guebuza.
Na segunda derrota para a Frelimo e Armando Guebuza, Afonso Dhlakama decide retirar-se da Cidade Capital para a Cidade de Nampula e, posteriormente, para as matas de Sofala onde reiniciam as hostilidades militares, em 2012 e viria a assinar o Acordo de Cessação das Hostilidades Militares a 05 de Setembro de 2013 com o Presidente Armando Emílio Guebuza. Nas eleições seguintes, a Frelimo teve como candidato Filipe Jacinto Nyusi, que viria a ganhar copiosamente e a Renamo de Afonso Dhlakama instala um “braço-de-ferro”, recusando reconhecer os resultados e exigindo governar nas Províncias onde, alegadamente, tinha ganho as eleições. Isso não foi aceite pela Frelimo e seguiram-se negociações que culminaram com o Acordo entre o Governo e a Renamo, tendo sido protagonistas Filipe Jacinto Nyusi e Afonso Dhlakama.
Este Acordo não teve muito sucesso, do ponto de vista da sua implementação. Não irei aqui entrar em detalhes, mas o certo é que a Renamo e Afonso Dhlakama continuaram a protestar o que culminou com o retorno às matas da Gorongosa. A circulação Sul-Centro-Norte era quase impossível, funcionava à base de escolta que, não poucas vezes, era atacada e várias pessoas mortas e meios materiais destruídos, entre bens públicos e privados. Ainda assim, o Presidente Filipe Nyusi manteve o compromisso de Paz e continuou à procura de Afonso de Dhlakama para negociar o fim das matanças, tendo iniciado com trégua por tempo determinado, renovado creio que duas vezes e depois viria a trégua por tempo indeterminado, que abriu espaço para encontros entre o Chefe do Estado e Afonso Dhlakama nas matas da Gorongosa.
Enquanto gozávamos as tréguas por tempo indeterminado, o povo moçambicano viria a ser abalado pela Notícia da morte do Líder da Renamo Afonso Macacho Marceta Dhlakama nas matas. Foi uma morte natural, por doença, a 03 de Maio de 2018, e seguiram-se momentos de incerteza. Mas muito rapidamente a Renamo reorganizou-se e indicou o General Ossufo Momade como seu coordenador interino, no Congresso da Renamo, realizado na Gorongosa, com participação de 700 Delegados e 300 Convidados em Janeiro de 2029. Ossufo Momade é eleito presidente, nestas eleições, derrotando Elias Dhlakama que ficou com 238 votos, Manuel Bissopo com sete votos e Juliano Picardo com cinco votos, Herminio Morais retirou a sua candidatura.
As eleições foram contestadas de forma veemente e dessa contestação surgiu a ala militar que desafiou a Renamo de Ossufo Momade e ficou nas matas, considerada a ala dos Generais. Esta ala não teve sucesso político, no entanto, foi usada para “divisão” da própria Renamo, o que fez com que perdesse as eleições de 2019 de forma marcante. Devido a esta continuação das hostilidades, o Governo foi obrigado a assinar outros dois Acordos com a Renamo, tendo sido protagonistas o Presidente da República Filipe Jacinto Nyusi e o General Ossufo Momade. Trata-se do Acordo de Cessação das Hostilidades Militares a 01 de Agosto de 2019 e do Acordo de Paz Definitiva, a 06 de Agosto de 2019.
Não haja dúvidas que o real fim das hostilidades militares é celebrado com a chegada ao fim do processo de DDR – Desmobilização, Desmilitarização e Reintegração dos Homens residuais da Renamo que se encontravam espalhados pelas várias bases criadas durante o período de Guerra. Isso aconteceu a 23 de Junho de 2023, ou seja, a nossa busca de Paz é incessante e continua com a reintegração dos homens da Renamo na sociedade, o que, até hoje, pode-se considerar de bem-sucedido.
Adelino Buque
Ainda fui a tempo, no início da carreira jornalística, anos oitenta até finais dos anos noventa, de ouvir histórias de tirar o cabelo, de electrizar um ser humano normal. Foram muitas e de diversa índole e que, de alguma forma, habitam no meu imaginário - alicerçadas, com efeito, em muito semelhante ao que vinha ouvindo desde a infância lá nas terras interiores de Chibuto. Uma rezava que um ministro visitou um certo distrito no âmbito das suas atribuições governamentais. O administrador mandou organizar uma recepção à altura do responsável que ia receber, como de praxe: uns grupos culturais locais. De facto, mal os carros da comitiva pararam e o chefe saiu da viatura, os grupos culturais puseram-se a fazer com mais intensidade o melhor do que sabem: batucadas, cantadas e dançadas, bastante bem harmonizadas. Um dos grupos tinha cobras que condimentavam a sua coreografia. Cobras vivas. E eis que o maestro se abeira do chefe, pega numa das cobras que tinha no seu próprio colo e enrola-a no do chefe. O chefe foi “homem”, não colapsou. Mas confessou, mais tarde, que esteve fora de si naquele e nos subsequentes momentos, tremendo foi o susto que apanhou, apesar de a cobra não ter feito muitos movimentos. Percebendo que o chefe estava bastante assustado, o administrador tratou de orientar ao maestro para tirar a cobra do corpo do chefe. Doravante, o ministro passou a andar menos pelos distritos e confessaria que aquela cena vive com ele no seu imaginário!
Histórias destas existem às milhentas, quer tendo como personagens principais administradores e ou governadores, quer directores nacionais. O querido leitor certamente que terá muitas mais ainda… - e pode acrescentá-las na versão do Facebook deste artigo.
Ouvíamos, igualmente, de administradores distritais que só iam dormir nos palácios passado bom tempo após a nomeação, seis meses ou ano, ano e meio. Não me perguntem ‘depois de, eles próprios, terem feito o quê exactamente’. O que se conta são mil e uma coisas: ou que durante a noite ouviam sons estranhos, ou gente conversando, multidão barulhando, por vezes cantando, ou andando, marchando; ou ainda cavalos ou burros galopando à volta da casa; para além de frequentes visitas nocturnas de animais selvagens, incluindo cobras, mas, dia seguinte, não se via uma única pegada de nada. Por tudo isto, não ocupavam de imediato os palácios, viviam nas casas de hóspedes por um período indeterminado... Mas também existem histórias daqueles responsáveis que não vão directamente ocupar os gabinetes dos predecessores, trabalhando a partir de outras salas; ou que mandam mudar todo o mobiliário na sala do antecessor...
Estas histórias (ou estórias) não surpreendem assim tanto para muitos de nós que crescemos a ouvir coisas e coisas do gênero. Por exemplo, crescemos a ouvir que para se ser rico, ter-se êxito na vida, em todas as áreas, era/é preciso “khendlar” (ir a um curandeiro ser tratado para tal). Na nossa filosofia bantu, aparentemente o sucesso não decorre de procedimentos metodológicos rigorosos, científicos, racionais, eficientes; mas, sim, de ter sido tratado por um grande curandeiro. Na nossa tradição, a ciência, ela sozinha, não leva ao sucesso, mas um excelente curandeiro sim. Muitos, até hoje, ainda acreditam nesta abordagem. Mesmo com o avanço da educação, da ciência e da tecnologia, há os que continuam amarrados a este pensar.
E, geralmente, dizia-se que os melhores curandeiros são os de longe e que os locais são aqueles “santos da casa”, que não fazem milagres! Foi assim que fomos ouvindo de locais bem distantes como os que tinham os melhores curandeiros, os mais, mais. Sítios como Panda Mudjekene, Funhalouro, Chigubo, Mabote, Mussapa, Inhassoro e …Govuro!, estão entre os locais com os melhores curandeiros. Dizendo simplesmente Govuro, pode passar despercebido a muitos; mas dizer… Mambone, já toda a gente fica em sentido! Mambone figura no top, fala-se dos maiores curandeiros da terra… com o seu famoso Nengue wa nsuna (pé de mosquito), que faz todos os milagres que o paciente quer - ser rico, ser saudável, conseguir não sei mais o que... E mais: a força/fama que Mambone tem, o medo que se tem são tais que só mencionar que… “já esteve em Mambone”… confere outras valências, consideração ou tratamento.
Sobre Govuro, aliás, Mambone, fala-se de curandeiros para cuja casa não precisa de guia, basta se decidir por ele, apanhar autocarro e descer na paragem certa, alguma coisa vai-lhe guiar até lá! E terminado o tratamento só sai estando o curandeiro satisfeito! Fala-se de outros em cuja casa só entra mediante certos rituais e que paga o tratamento com “catorzinhas”, tendo ele já uma quantidade incontável de “mulheres”; ou de uns outros que, gostando da paciente (mulher que pretende o tratamento), torna-a esposa, no lugar de a tratar e deixá-la ir para a sua vida! Fala-se de tudo mais alguma coisa…
Foi assim que conhecer Mambone ficou uma obsessão. Não para ir ao tratamento, khendlar, mas para ir compreender um pouco mais a dimensão humana, a abordagem da vida que torna as pessoas ricas sem trabalho árduo, mas através de magia. Nunca consegui oportunidade. Contudo, há dias, fui dar a Mambone - a famosa Mambone - e, depois, a Nova Mambone! Bem gostaria de ter ido a casa de uns tantos desses curandeiros famosos, conversar com eles, entrevistá-los, reportar o ambiente diário que os rodeia, entender a lógica, a vida deles e registar em obra. Mas… fica a consolação de ter conhecido Mambone, o famoso Mambone. Um dia… talvez!
Mambone que, afinal, em termos de geografia natural, física, é uma terra, com tudo o que uma terra normal compreende, pesem as suas especificidades, famas, complexidades, particularidades e riquezas em, entre outras coisas… curandeiros destros, exímios e famosos!
ME Mabunda
“Hoje, 02 de Outubro de 2023, valerá a pena evocar o colonialismo português para justificar o nosso atraso? Valerá a pena evocar a guerra dos dezasseis anos para justificar o nosso atraso? É que passam 48 anos da independência nacional, em que foram protagonistas a FRELIMO – Frente de Libertação de Moçambique e o Governo Português. Passam igualmente 31 anos do Acordo Geral de Roma entre o Governo de Moçambique e a Renamo. Os votantes que assistiram à independência nacional com 18 a 20 anos, hoje, andam pelos 70 anos. Já os que assistiram à assinatura do Acordo Geral de Paz têm, aproximadamente, 46 a 48 anos de idade, por isso, no debate político rumo às eleições de 11 de Outubro de 2023 e outras que se seguirão, evocar o colonialismo Português ou a guerra dos dezasseis anos é falar para um público inexistente. Diria, em termos mais simples, é um não debate”.
AB
“Infelizmente, grosso dos jovens moçambicanos morrem de amores pela RENAMO, muito embora tenha praticado espancamentos de civis, violações de mulheres, saques de bens privados e públicos, incêndios de aldeias, raptos, mutilações e morto a tiro, com manchetes, baionetas e paus muitos moçambicanos indefesos. Todo este tipo de matanças e maus tratos são relatados no tal Relatório Gersony de 1988 e há ainda hoje milhões de moçambicanos que sofreram na carne tais maus tratos”.
In Gustavo Mavie, artigo com o título: MILHÕES DE MOÇAMBICANOS DE AMBOS OS SEXOS ESTÃO A SER FACILMENTE DOMINADOS PORQUE NÃO CONHECEM A NOSSA HISTÓRIA DAÍ QUE MORREM DE AMORES POR PARTIDOS RUINS.
Hoje, 02 de Outubro de 2023, estamos a nove dias para exercermos o direito de votar e alguns de serem votados nas eleições Autárquicas de 2023, ou seja, ainda temos à nossa disposição sete dias para o debate político, ao que se seguirão dois dias de reflexão e depois a votação. São regras estabelecidas pela Lei eleitoral em vigor que não permite a votação logo a seguir a campanha eleitoral, abrindo espaço para que o cidadão vote em consciência e não na emoção da campanha, nada mau.
O que não deve ser debate político nesta fase!
Li e compreendo o artigo publicado pelo meu amigo e Makague, Gustavo Mavie. Chegou a minha caixa no dia 30 de Setembro de 2023 e li, igualmente, a reacção do Senhor Damião Cumbane a esse texto de Gustavo, em torno do qual aproveito, também, para fazer a reflexão, trazendo aquilo que, na minha opinião, não deveria servir de base para um debate político hoje, no ano de 2023, a saber:
1) O atraso no desenvolvimento nacional atribuído ao Colonialismo Português;
2) O atraso atribuído à Guerra dos 16 anos entre a Renamo e o Governo de Moçambique;
3) Baixo nível de escolaridade e de saúde atribuído à falta de recursos.
Ora, em 1975, Moçambique ascendia à independência nacional, fruto da Luta de Libertação desencadeada pela Frente de Libertação de Moçambique, FRELIMO, que durou 10 anos. Hoje, 2023, passam 48 anos após esta data histórica da nossa libertação dos mármores coloniais. Depois do 25 de Junho de 1975, tudo que se passou de lá a esta parte resultou de opções do Governo de Moçambique, cabendo a esse Governo assumir os sucessos e fracassos desta nova era.
A Renamo, Resistência Nacional Moçambicana, surge logo no período pós-independência nacional e foi criada, segundo reza a história, por um grupo de portugueses que não estavam de acordo com a independência de Moçambique e tiveram como base de suporte moral e logística a África do Sul do Apartheid, donde receberam treinos militares e suporte em armas para destruírem o Governo de Samora Machel. Para os sul-africanos bóeres, estavam a defender-se do perigo “Comunista” que a FRELIMO trazia com a independência nacional. Até aqui, tudo bem.
No entanto, com o tempo e reconhecendo que a Guerra não traria solução para o diferendo entre a Renamo e o Governo de Moçambique, aqui excluo as motivações da Guerra por não representar absolutamente nada de interesse, o Governo de Moçambique procurou a aproximação com a Renamo, mas, antes de tudo, tratou de rever a Constituição da República com dois objectivos essenciais a saber:
a) Abertura da economia centralizada para a economia do mercado, cujas regras seriam ditadas pelo Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional e;
b) Abertura para a existência de mais do que um partido, ou seja, abertura para o Multipartidarismo.
Deste modo, para efeitos de implementação da abertura para o mercado livre, o Governo adoptou o PRE – Programa de Reabilitação Económica. Desenhado e implementado por nós moçambicanos, este programa retirou das mãos do Estado toda a base económica e privatizou. Hoje, a maioria da indústria deixada pelos colonos desapareceu, quer por incapacidade de concorrer num mercado cada vez mais exigente, quer porque as políticas do Governo não favoreciam para o crescimento destas indústrias nacionais e na mão de novos donos, diga-se. Grosso modo sem o conhecimento adequado e nem capital que requeriam para se manterem no mercado.
Ora, pode-se trazer vários argumentos, de acordo com a pessoa que argumenta, mas a nossa falência na área da indústria deveu-se às políticas que o Governo concebeu no âmbito do PRE – Programa de Reabilitação Económica e subsequentes. Hoje, o sector privado tem vindo a queixar-se de algumas políticas fiscais que não favorecem o desenvolvimento, políticas de Terra, políticas de investimento bastante penalizadoras, políticas monetárias, com juros a roçarem a agiotagem de entre outras e o nosso Governo não tem feito absolutamente nada para reverter a situação. Amanhã, iremos atribuir a quem a culpa! Vamos aprender a assumir as nossas responsabilidades como nação.
Por outro lado, com a Constituição de 1990, Moçambique abre-se para a emergência de mais partidos políticos, lembrando que a Constituição de 1975 dizia que em Moçambique só poderia existir um e único partido, a Frelimo. Repare que aqui não estou a fazer qualquer que seja a crítica, estou a constatar apenas. Se a decisão era correcta ou não, esse é outro debate em outro Fórum e não cabe nesta reflexão. A abertura para a emergência de mais do que um partido permitiu ao Governo de Moçambique aproximar-se da Renamo e estabelecem um Acordo de Paz, que veio a ser designado Acordo Geral de Paz, assinado em Roma, Itália, entre a Renamo e o Governo de Moçambique, tendo sido protagonistas o Senhor Afonso Macacho Marceta Dhlakama, Presidente da Renamo, e o então Presidente da República, Joaquim Alberto Chissano a 04 de Outubro de 1992.
Em 1994, fruto desse acordo de Paz, realizaram-se as eleições Gerais Multipartidárias, para a eleição do Presidente da República e os Deputados da Assembleia da República, iniciando uma nova fase do Moçambique independente. Com esta nova fase, estavam abertos os caminhos para a reconciliação nacional e o enterrar do “machado de guerra”. Ora, se isso aconteceu ou não, devemos nos questionar a nós próprios e não a terceiros, o processo é dos moçambicanos e devo recordar que o dia 04 de Outubro está consagrado no nosso calendário como o dia da PAZ, exactamente porque marca o fim da guerra dos 16 anos em Moçambique.
Dito isto, evocar a guerra dos 16 anos para justificar seja lá o que for pode constituir uma atitude de má-fé por parte de quem o faz. Não estou ignorando os efeitos que causou na vida económica e social dos moçambicanos, mas porque assumimos que a guerra acabou e tudo quanto tem com ela relação é que, se não fazemos isso, significa que a guerra continua a ser a causa da nova desunião e a reconciliação estará longe do nosso alcance, o que não pode ser verdade. Nós moçambicanos estamos nos reconciliando e o exemplo é o sucesso do DDR – Desmobilização e Desarmamento e Reconciliação.
Posto isto, estamos independentes há 48 anos, assinamos o Acordo Geral de Paz há 31 anos e isso significa que os cidadãos nacionais de hoje, com 50 anos, não conheceram o colonialismo Português, que os cidadãos nacionais com 35 anos não conheceram a Guerra dos 16 anos entre o Governo de Moçambique e a Renamo. Para estes cidadãos, a Renamo, Frelimo, MDM, Pahumo, Partido Trabalhista e outros são partidos que concorrem para a Governação de Moçambique em pé de igualdade, se tem AMORES pela Frelimo, pela Renamo, pelo MDM é apenas uma questão de opção e nada mais…
Adelino Buque